Sob os charmes da capital

Dia 09 – Armei a motoca outra vez e deixei as belezuras de Punta del Este numa gavetinha da memória. O destino? Montevidéu, capital do Uruguai. Procurei, e, de forma pressionada pelo tempo e iminência da estrada, selecionei um dos primeiros hostels da lista do aplicativo e toquei a mão na Mochileira.

Mal coloquei o pé na cidade e já me deparei com uma arquitetura de tempos atrás, de muita classe e atraente. No registro de entrada, toda boa recepção do Caio, paulista, amante das motos custons e viajante de início, como eu (que depois iria matar a saudade de sua Shadow 600cc ao bandear-se com a delgada Intruder por vias montevideanas).

Lá dentro, muitos brasileiros itinerantes, franceses e argentinos. No mercado, várias empanadas, baratas e saborosas. Para o jantar, a salvadora massa instantânea.

A orla que a chuva disputa

Mais tarde, com o Caio, fomos às beiras do imponente Rio da Prata, onde poucos minutos depois, o céu invejara-o e também quis mostrar seu repertório. Encontramos dois cariocas na orla e rapidamente nos juntamos atrás de um contêiner, contra a inclinação da chuva, e ali pouco nos molhamos. A não ser aos moderados goles do litro de cerveja, de nossa parte, e vinho, dos cariocas. Enquanto descia água, subiam variadas histórias do sudeste.

No outro dia me larguei com a motoca para alguns pontos da cidade. Passei pela Ciudad Vieja, seu Teatro Solís e saboreei uma empanada nas gramas da Plaza Independencia. Diversidade de artistas, ritmos e danças. Ruben Rada sendo interpretado pelo jogo de pernas de um dançarino solo, acompanhado de seu rádio e do calçadão.

Na Plaza Constituición, comprei um adesivo da bandeira uruguaia na feira de artesanato, em seguida dei uma espiada no Museu de los Andes e me bandeei para a espetacular Catedral de Montevideo.

Em terra de Galeano, as veias labirínticas das charmosas librerías

Em um mini roteiro literato, me deparei com lindas livrarias, incríveis e labirínticos sebos e adquiri meu primeiro livro castelhano na banquinha de rua do seu César. Senhor das páginas antigas, querido e paciente vendedor de sonhos das calles de Montevidéu, ex-morador de São Paulo. Das páginas em mãos, um atraente exemplar da chilena Isabel Allende.

Adiante, nas redondezas do majestoso Estádio Centenário, encontrei com o uruguaio Juan e o carioca Eduardo, munidos com suas Suzuki Boulevard 800cc. Uma dupla de velhinhos bons de moto – e de papo. Trocamos contatos, nos despedimos ali e regressei a tempo de pegar um belo pôr-do-sol platino.

A velha dupla motoqueira me disse para procurá-los na manhã seguinte, pois fariam roteiro pelas redondezas. No fim das contas, sempre apertado de agenda, acabei não contatando os caras. No decorrer do dia seguinte, atento às postagens nas redes sociais dos novos camaradas, percebi o meu erro. Eles foram de encontro à Pepe Mujica, icônico senador e ex-presidente uruguaio. Quanto a mim, lastimado até os fios de cabelo por não ter participado desse magnífico encontro.

Sobre telhados alheios

Pelas arquiteturas aconchegantes do hostel, o casal argentino Roma e Gustavo trataram de animar ainda mais nossa estadia com buenas ondas. O John, do Rio, que quer cruzar duas Américas, até o México, em uma bicicleta. Quanto nomadismo em um só lugar. À noite, subimos no terraço, onde a Vanessa, de Salvador, armou sua luneta para mirarmos a lua. Montevidéu de nacionalidades, receitas e dicas. Claraboias, gatos e estrelas.

Antes de partir, troquei o óleo da pequena, lubrifiquei a corrente, enchi o tanque e toquei em direção à cidade de Colonia del Sacramento. De lá, a ideia seria subir 200 km e cruzar a ponte internacional na cidadezinha de Fray Bentos. Nesse rumo, a direção era uma só: caminhos argentinos.