Uma plataforma para cosmovisões

Diretamente do bravo, aclamado e emocionante discurso do indígena que fincou bandeira no Congresso, na Constituinte de 1987, em defesa da Emenda que garantiria a soberania dos povos originários deste país, cá está a mais nova dica literária destas páginas mochileiras.

O exemplar filosófico da vez é advindo do mestre Ailton, indígena da etnia Krenak. Líder ambientalista e escritor brasileiro, é reconhecido internacionalmente. Nas páginas de ‘Ideias para adiar o fim do mundo’, o ideal da preservação ambiental, do reavivamento através do uso consciente dos recursos da natureza.

“O que está na base da história deste país, que continua a ser incapaz de acolher os seus habitantes originais – sempre recorrendo a práticas desumanas para promover mudanças em formas de vida que essas populações conseguiram manter por muito tempo, mesmo sob o ataque feroz das forças coloniais, que até hoje sobrevive na mentalidade cotidiana dos brasileiros -, é a ideia de que os índios deveriam estar contribuindo para o sucesso de um projeto de exaustão da natureza”.

Hoje estamos todos diante da eminência de a Terra não suportar a nossa demanda

Quando em 2015 rompeu a barragem do Fundão em Mariana/MG – o maior crime socioambiental do Brasil – causando mortes, devastação e poluição extrema nas águas do Rio Doce, base de antigos povos, inclusive do território Krenak, onde o próprio Ailton cresceu, o escritor disse em entrevista:

“Não foi um acidente. Quando eu ouço perguntarem sobre ‘o acidente’ de Mariana, eu reajo dizendo que não foi um acidente. Foi um incidente, no sentido da omissão e da negligência do sistema de licenciamento, supervisão, controle, renovação das licenças, autorização de exploração”.

“Quando despersonalizamos o rio, a montanha, quando tiramos deles os seus sentidos, considerando que isso é atributo exclusivo dos humanos, nós liberamos esses lugares para que se tornem resíduos da atividade industrial e extrativista”.

Quando você sentir que o céu está ficando muito baixo, é só empurrá-lo

Carregado de mensagens elucidantes quanto ao tema da conservação do meio ambiente, as ideias de Krenak para adiar o fim do mundo soam essenciais. Nós brasileiros ainda somos alienados e cultuadores de uma historiografia imprecisa em relação às tribos originais deste planeta.

O cenário atual em relação às políticas ambientais no Brasil é desanimador. O claro desmonte e descaso com as instituições de prevenção e reparo. Queimadas, agrotóxicos, óleo na costa litorânea. O inconsequente sufocamento de quem depende da floresta para sobreviver.

“Está cheio de constelações de gente espalhada pelo mundo que dança, canta, faz chover. O tipo de humanidade zumbi que estamos sendo convocados a integrar não tolera tanto prazer, tanta fruição de vida. E a minha provocação sobre adiar o fim do mundo é exatamente sempre poder contar mais uma história. Se pudermos fazer isso, estaremos adiando o fim”.

Assim como Krenak, prosseguimos munidos dos ensinos de líderes indígenas imprescindíveis, como Davi Yanomami e Raoni Metuktire. Dentre outros e outras, eles vêm alertando há décadas sobre o problema causado, principalmente, por mineradoras, fazendeiros, madeireiros e grileiros. “Porque é a floresta que segura o mundo. Se acabarem com tudo, não é só índio que vai sofrer” – Yanomami. Há planos secundários inumeráveis, fato é que não existe planeta B. (Brumadinho: em memória).

Vem comigo através de outras páginas.